Em meados dos anos 1948, um menino que morava no Edifício Marahu, na praia do Itararé, em São Vicente, dedilhava pela primeira vez as teclas do piano comprado pelo pai. O dom evidenciou-se de imediato e, em poucas semanas, já dominava 23 obras de Bach, sem saber, até então, ser um predestinado para a música.
O pequeno João Carlos Martins cresceu, se tornou um dos maiores pianistas do mundo, enfrentou percalços, reinventou-se como maestro e, sete décadas depois, a apenas duas quadras de onde tudo começou, abrilhantou o Encontro de Educadores de São Vicente, no Ilha Porchat Clube, na noite de quarta-feira (16).
O músico de 84 anos fechou a edição 2024 do evento formativo que reuniu 3 mil profissionais da rede municipal de ensino, entre professores, gestores e funcionários.
Antes de subir ao palco, um vídeo da Fundação Bachiana e do Sesi-SP exibiu sua trajetória de sucesso e o drama de perder os movimentos da mão direita. “Aos 63 anos, depois de 29 cirurgias, soube que nunca mais poderia tocar profissionalmente”. A genialidade migrou para a regência, e o pianista reinventou-se como maestro, até conseguir voltar às teclas graças a uma luva especial.
Agradecendo sempre ao dom que Deus lhe deu, Martins levou importantes mensagens aos educadores vicentinos, ensinando que é preciso saber que o dom representa dois por cento, mas 98 por cento é a disciplina. “Aos 15 anos me determinei a levar o nome do Brasil para fora e fiquei aqui em São Vicente me preparando, até que aos 18 anos saí do país e ganhei o primeiro prêmio do concurso internacional”.
Traçando uma comparação com o ofício da pedagogia, o maestro ensinou que da mesma forma que “um artista transmite emoção, assim é também o professor, que como o músico tem a missão de tirar uma lágrima dos olhos e um sorriso do público”.
A habilidade com o piano também mostrou-se com as palavras durante a palestra, e Martins intercalou sabedoria com música. Finalizando, o bachiano revelou que despede-se dos palcos em maio, no Carnegie Hall, onde fará sua 30ª apresentação em Nova York, mas garante que os projetos futuros continuam. “Com minha equipe, fiz uma proposta que vou apresentar no Senado Federal em 3 de dezembro, para instituir a música nas aulas de arte, com 15 minutos obrigatórios. Vou partir para esta última fase até o apagar das luzes, e tentar deixar um legado”, revelou, com a humildade de quem desconhece o tanto que já fez pelo Brasil.
Prévia - Antes de João Carlos Martins subir ao palco, o público foi presenteado com a apresentação do aluno Gabriel Gomes Maciel e seu professor Willian Monteiro, da UE Pastor Joaquim Rodrigues da Silva (Náutica). Com violino e trombone, a dupla levou ao palco a Ária na Corda Sol, de Bach, e Aquarela, de Toquinho. “Não tenho muito o que falar, apenas agradecer por estar aqui”, disse o jovem violinista, que entregou com maestria a atração principal.
Texto - Renato Pirauá
Fotos - Thadeu Filho