Determinada e resiliente, Sônia da Silva, de 55 anos, é o exemplo de quem sempre acreditou que a educação é o caminho mais seguro para mudar a própria realidade. Filha de um pedreiro e de uma dona de casa, cresceu na comunidade da Vila do Sapo, em Praia Grande, em meio a muitas dificuldades. “Faltava tudo. Muitas vezes, a gente ia à feira catar o machucadinho das frutas, as cabeças de peixe… O que os feirantes dispensavam, pegávamos para comer”, relembra.
Desde muito jovem, Sônia começou a trabalhar para ajudar a família. “Acho que eu tinha uns 10 anos quando comecei num mercadinho. Pesava verduras, empacotava... Depois fui babá, trabalhei em açougue, vendi roupas e até matar frango em avícola eu já matei”, conta, rindo. Mesmo diante das adversidades, nunca deixou de sonhar. A inspiração veio ainda no ensino fundamental, com o professor Kalid — “um homem justo, coerente e amigo” — que marcou sua vida da 2ª à 4ª série. “Ele era diferente. Dava atenção, era humano. Foi ali que eu decidi ser professora”.
Primeira da família a se formar, enfrentou uma rotina exaustiva para conciliar trabalho e estudos. “Eu trabalhava o dia inteiro e estudava à noite. Depois fui pra Presidente Prudente, porque o curso era só aos finais de semana. Era cansativo, mas eu tinha um objetivo”.
A trajetória acadêmica também exigiu determinação. “Comecei a faculdade na Unimonte, mas não conseguia conciliar, porque precisava trabalhar nos três períodos para ajudar minha família. Foi então que optei por cursar em Presidente Prudente, onde as aulas ocorriam apenas aos finais de semana. Às sextas-feiras, eu pegava uma van com outros estudantes e seguíamos juntos para as aulas”, lembra.
Já formada, passou a atuar na rede estadual, onde permaneceu durante 12 anos como professora dos anos iniciais do ensino fundamental. A primeira experiência foi justamente na comunidade em que cresceu, o que tornou o começo mais natural. “Eu já conhecia as famílias e os alunos. Estava no meu ambiente, entre pessoas que faziam parte da minha história. Por mais que o bairro fosse considerado perigoso, era o meu lugar, e eu me sentia acolhida”, relata.
Em meio à vida escolar, montou uma confecção de roupas de praia para complementar a renda. “Lecionava no período da manhã e costurava até de madrugada, passando a produção para ambulantes, que vendiam cangas, vestidos, shorts e blusinhas no cambão”.
Já era mãe quando enfrentou uma das fases mais difíceis da vida: a perda da irmã, vítima de uma bala perdida. A partir desse momento, passou a criar também a sobrinha. Com o falecimento da mãe, assumiu ainda a responsabilidade pela irmã mais nova, então adolescente. Apesar das dores e desafios, Sônia nunca desistiu de seguir em frente, encontrando na educação sua maior força e fonte de esperança.
Hoje, com três décadas de experiência na rede pública e atuando como supervisora de ensino em São Vicente, Sônia é exemplo de superação e inspiração. Sua história reflete o poder transformador da educação e o impacto de quem acredita no que ensina. “A educação é resiliência e fé. Foi o estudo que me trouxe até aqui. Sem ele, a gente para no tempo. A educação transforma não só o indivíduo, mas toda uma sociedade”, afirma, com a serenidade de quem viveu na pele o valor de cada conquista.
Texto - Renato Pirauá



