“Meu escritório é na praia, eu tô sempre na área” - Charlie Brown Jr. (Zóio De Lula). O Itararé acordou diferente na quarta-feira. Entre manobras de skate, a brisa do mar e a energia única da orla, o Parque da Juventude ganhou câmeras, refletores e a magia do cinema. Foi ali que São Vicente entrou para a cinebiografia de Alexandre Magno de Abrão, o Chorão, vocalista do Charlie Brown Jr., com o ator José Loreto protagonizando o papel principal da obra “Se Não Eu, Quem Vai Fazer Você Feliz?”.
O espaço esportivo, que já é ponto de encontro de jovens e referência cultural na Cidade, agora se transforma também em cenário de filme. Três cenas foram gravadas na pista de skate no local, marcando de forma definitiva a presença de São Vicente em uma obra que promete emocionar fãs de todo o Brasil.
Para a Cidade, não é apenas mais uma filmagem, mas um privilégio: ver o Parque da Juventude estampado em uma produção nacional é reconhecer o valor de um espaço que pulsa vida e que agora será visto nos cinemas, levando o nome da Primeira Cidade do Brasil para além das ondas do litoral.
Além da equipe técnica e do elenco, quem também brilhou foi a equipe de figurantes vicentinos, que levou para o set o entusiasmo de participar de um projeto tão especial. Entre eles, o professor de surf Arthur Toledo, de 22 anos, que mora na região há cerca de dez anos e nunca tinha atuado antes.
“Eu vi a seleção em um grupo no WhatsApp e me inscrevi sem saber exatamente o que era. Quando descobri que era sobre o Chorão, fiquei emocionado. Não tem como não ser fã. Fazer parte disso é uma oportunidade única, ainda mais aqui na Baixada, onde nem sempre temos tantas chances como essa”, contou.
Já a atriz e modelo Fernanda Pereira, de 29 anos, moradora de São Vicente, soma quatro anos de carreira em produções da Netflix, Globo e teatro, mas garante que estar na cinebiografia de Chorão tem um sabor diferente:
“É muito legal viver isso aqui, na minha própria cidade. O Chorão é um símbolo da Baixada Santista e ver uma produção desse porte valorizando os nossos espaços mostra que o audiovisual pode — e deve — crescer também aqui. Esse filme acende São Vicente”, destacou.
Outro personagem que roubou a cena foi o skatista e produtor audiovisual Lucas do Nascimento, de 25 anos, que também conseguiu espaço como figurante. Para ele, estar no filme é um misto de orgulho e representatividade:
“É incrível. Eu já disse pros meus amigos que vou carregar isso pra sempre, é uma ‘carteirada’ que vou dar com muito orgulho. O Chorão é um símbolo do skate, é tradição. Me sinto escolhido por poder representar, porque muitos skatistas queriam estar aqui. O que ele significa para nossa cena é enorme”.
O longa é inspirado no livro Se não eu, quem vai fazer você feliz? Minha História de amor com Chorão, escrito por Graziela Gonçalves, a Grazon, como é carinhosamente chamada pelos fãs e viúva de Chorão. A obra narra desde o primeiro encontro dos dois, antes da criação da banda, até os anos de convivência que revelaram o “Alê” além do microfone: suas paixões, inseguranças e a luta contra a dependência química que culminou em um fim precoce.
“Eu me lembro do Alê, o homem que existia além do ídolo que ele se tornou, com quem dividi minha vida. Seu jeitão de eterno menino, com seu sorriso largo e abraço generoso, que me ensinou a amar de verdade, a não ter medo de demonstrar meus sentimentos […]”, escreveu Grazon em seu livro.
Responsável pela produção, Fábio Zavala também foi o nome por trás do documentário Chorão: Marginal Alado, e reforça que a cinebiografia nasce do desejo de retratar o artista em sua essência:
“O documentário foi o ponto de partida. A gente se dedicou muito, se envolveu em todas as partes e entendeu que ele era um personagem riquíssimo, o nosso último rockstar. Ele tinha força, fraquezas, altos e baixos, o que o tornava um artista muito completo. Produzir algo sobre o Chorão é muito sagrado. Procuramos ser o mais dignos possível, trazendo suas verdades, suas dores, mas também o impacto imenso que ele teve”.
“Sigo imprimindo meu nome na história” - CBJr (Como Tudo Deve Ser).
Fundada em 1992, a banda Charlie Brown Jr. marcou gerações com atitude, poesia urbana e a autenticidade da Baixada Santista. Liderada pelo eterno Chorão (vocalista e compositor), o grupo contou ainda com Luiz Carlos Leão Duarte Júnior, o Champignon (baixista), artista completo que nos deixou em 9 de setembro de 2013; Marco Britto Júnior, o Marcão (guitarrista); Thiago Castanho (guitarrista); e Renato Peres Barrio, o Renato Pelado (baterista).
Ao longo da trajetória, o Charlie Brown Jr. acumulou conquistas que atravessaram fronteiras, como dois Grammy Latinos de Melhor Álbum de Rock Brasileiro (2005 e 2010), o Prêmio Multishow de Melhor Canção por Senhor do Tempo (2007) e de Melhor Videoclipe por Pontes Indestrutíveis (2008). Também foi consagrado no MTV Video Music Brasil (VMB), recebendo títulos como Banda Revelação (1998) e prêmios por clipes marcantes como “Rubão, o Dono do Mundo” e “Só por Uma Noite”.
Mas, para os jovens da época, o Charlie Brown Jr. foi muito além de prêmios. Era identidade, era refúgio. Chorão falava a mesma língua de uma geração que a sociedade muitas vezes tentava calar. Dava voz à liberdade de ser quem se é, sem máscaras nem preconceitos. Representava orgulho de ser da Baixada, coragem para enfrentar opressores e fé na própria vitória, mesmo quando tudo parecia puxar para baixo. Charlie Brown Jr. é amor, é resistência, é luta — e continua sendo esperança.
No dia 6 de março de 2013, o corpo de Alexandre Magno Abrão partiu, mas sua alma segue presente em cada verso, cada memória e cada coração que carrega suas mensagens.
“[…] me deixo viajar de volta para aquela tarde de 2011 e sentir mais uma vez a alegria de poder ter dividido tantas coisas com o Alexandre. O sentimento mais puro de gratidão me invade com força e agradeço a oportunidade que a vida me deu de viver esse amor, tão intenso, único e especial.” — Se não eu, quem vai fazer você feliz, de Graziela Gonçalves.
“Você deixou saudade” — CBJr (Só Os Loucos Sabem).
Por Jessica Costabile



